quinta-feira, 23 de agosto de 2007

"Ah sim, voltei para casa".

Ela estava dormindo e ouviu uma voz a acordando, estranhou por um momento não estar sozinha. A voz era sua mãe. Ela já não sabia mais o que era ser acordada pela mãe e abrir os olhos já recebendo instruções para o restante do dia. Parou sem entender por um momento o que estava acontecendo, até que pensou " Ah sim, voltei para casa". Ficou enrolando na cama, afinal não tinha mais compromissos, pelo menos era o que achava.
Não demorou muito tempo para que uma lista de coisas que precisava fazer se formasse na sua mente, óbvio que seus pais periodicamente ditavam uma ou outra para garantir que ela não esqueceria nada, e afinal, uma pressão paternal sempre é comum.
Em um rítmo lento, ainda pensando nas histórias mirabolantes que sua mente meio distorcida criara durante seu sono, levantou-se e foi tentando se convencer de que aquele momento é que era o sonho e que assim que abrisse os olhos estaria vivendo sua vida tão desejada. Quando percebeu que ali era sua vida mesmo acontecendo, envergonhadamente se sentiu decepcionada por seu pensamento não se realizar.
Sabia que era egoísmo seu, e que sua vida que ficava no progride- não progride afetava outras pessoas que estavam sendo muito pacientes com ela, ironicamente essas pessoas eram essencialmente seus pais.
Resolveu fazer suas tarefas, mas sem deixar de dar um jeito em fazer as coisas que queria acontecerem, porque, acima de tudo era humana, e precisava garantir alguma diversão. Começou arrumando suas coisas e imaginou que dali poucas horas estaria livre. Jogava coisas fora, limpava, guardava, jogava mais coisas fora, guardava mais coisas... Não fazia idéia de que tinha tantas coisas para se livrar e tantas coisas para guardar! E o mais engraçado é que não sabia nem da onde havia tirado essas coisas.
Enquanto fazia suas tarefas continuava a criar histórias na sua mente, ela podia jurar que algum dia sua própria mente a levaria à loucura. Fantasiava a tal ponto, que às vezes esquecia que determinadas histórias eram produto da sua mente e não acontecimentos reais e elas realmente a afetavam, até que ela em um esforço convencesse a si mesma que era só mais uma das suas criações.
Seu dia caminhou de tal forma, que era tarde da noite e ainda estava arrumando coisas. Já tinha feito de tudo em sua mente: vivido a vida idealizada, criado histórias, tentado adivinhar o que quase todas as pessoas que conhecia estavam fazendo, xingado inúmeras vezes sua incapacidade de obter dons mágicos para que seu trabalho terminasse logo...
A última coisa que lhe faltava arrumar eram seus pensamentos, cada um em sua devida gaveta: a de sonhos, a de coisas a serem esquecidas, a de coisas a serem lembradas, a de divagações sem sentido... E assim por diante.

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